A IMPORTÂNCIA DAS MAQUIATRIZES NA AUTOESTIMA DA MULHER NEGRA
A IMPORTÂNCIA DAS MAQUIATRIZES NA AUTOESTIMA DA MULHER NEGRA
Nov 19, 2020

A IMPORTÂNCIA DAS MAQUIATRIZES NA AUTOESTIMA DA MULHER NEGRA

Mayra Maldjian FOTO: Andrea Dematte, Cassandra Velloso, Maia Boitrago, Mika Safro, Pedro Zafalon, Yago Rocha, Daniele da Mata

Mais da metade da população brasileira (56%) identifica-se como negra, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE. Mesmo assim, uma pesquisa inédita realizada pela marca de cosméticos Avon em parceria com a consultoria Grimpa mostrou que mais de 70% das mulheres negras brasileiras estão insatisfeitas com as opções de produtos específicos para elas encontrados no mercado.


Quem vê as ações de marketing desses grandes grupos da indústria de cosméticos, muitas delas voltadas para a inclusão da mulher negra, talvez se espante com esses dados alarmantes, mas a realidade por trás dos holofotes mostra que esse setor, apesar dos avanços, ainda tem um longo caminho pela frente para atender de fato às demandas das mulheres negras brasileiras.


A pesquisa, que entrevistou mil mulheres, entre pardas e pretas, na faixa etária de 18 a 60 anos, em todo o território nacional e de todas as classes sociais, focou nas categorias de base, pó e corretivo, que estão ligadas diretamente ao tom de pele das consumidoras. De acordo com o levantamento, a maior dificuldade é encontrar a cor compatível com seu tom de pele. 57% delas,, inclusive, precisam comprar mais de um tom para fazer uma misturinha e assim se aproximar da sua cor.


O que pode parecer um problema superficial é, na verdade, um resultado dilacerante do racismo estrutural da sociedade brasileira, e que mexe profundamente com a autoestima das mulheres negras. Por conta disso, nos últimos anos tem surgido um lindo movimento de maquiatrizes que trabalham pela desconstrução de padrões e pela valorização da beleza negra por meio da maquiagem, criando novas narrativas para as manas pretas no país.


Para homenagear o Dia da Consciência Negra, contamos abaixo um pouco sobre vida e obra de algumas dessas profissionais:




Cabeleireira há 15 anos, WELIDA SOUZA fez seu nome trançando cabelos e, assim, resgatando as raízes ancestrais de muitas mulheres e homens negros no Brasil. Entre sua clientela estão nomes como Negra Li, Emicida, Karol Conka e o astro do Orlando Magic, Aaron Gordon. Mexer com a cabeça de seus irmãos e irmãs negros também mexeu com sua visão e, em 2016, sentiu a necessidade de ampliar sua área de atuação, para empoderar mais e mais pessoas com sua arte. Foi então que incorporou a maquiagem às suas habilidades e enveredou pelo mundo da beleza. "Meu foco é me desafiar sempre, minha missão é em busca da excelência", afirma.


Recentemente, passaram por suas mãos de maquiatriz e modeleira, como se define, as atrizes Cris Vianna, Pathy Dejesus e Taís Araújo. O seu Instagram, @welidaq, é só desfile de beldades. "A maquiagem é transcendental e vai muito além de questões relacionadas à vaidade e beleza", comenta. Entre as conquistas recentes do mercado, Welida aponta para o aumento da oferta de bases para todos os tons e necessidades de cada pele, e de produtos especializados para cabelos crespos e cacheados.


Como referências, a profissional incensa Camila Anac, Carol Romero, Simone Souza e Damata. "Essas mulheres são extremamente competentes, profissionais com trabalhos lindos e de extrema importância e relevância no ramo da beleza, mulheres pretas com histórias que se cruzam e se atravessam."



CASSANDRA VELLOSO
tem muitas facetas profissionais e todas elas convergem para o fortalecimento da autoestima e do autocuidado da mulher, especialmente da mulher negra. Uma delas, a maquiagem, entrou para sua vida há oito anos, época em que começou a trabalhar numa multinacional famosíssima do setor. Encantou-se por essa arte à primeira vista e viu nela a possibilidade de construir novas narrativas para as manas pretas. "A gente vive num mundo que ainda ignora a beleza negra, e a maquiagem acaba tendo um papel social que está muito relacionado à aceitação, ao entendimento da nossa beleza, da nossa estética, da valorização dos nossos traços".


Segundo Cassandra, é recente o movimento das marcas de cosméticos para atender as  demandas das mulheres negras e desconstruir o padrão eurocêntrico de beleza. "Há dez anos era extremamente desafiador encontrar, por exemplo, uma base para uma mulher negra de pele retinta. Hoje está um pouco mais fácil, houve um avanço em relação a isso, mas ainda não é o cenário ideal", avalia. "As marcas têm mostrado uma comunicação e uma identidade visual mais inclusiva. Isso é maravilhoso, mas num país onde o racismo está enraizado, é importante que essa inclusão esteja também nos escritórios, nas equipes que elaboram as campanhas de marketing, os produtos e os serviços, para de fato ter mais representatividade, mais acesso, mais oportunidades para pessoas pretas".


"Lembro sempre de um termo que ouvi da filósofa Katiuscia Ribeiro e que algumas personalidades como Beyoncé usam em seus discursos que é "sulear". Precisamos sulear nosso olhar, olhar para a realidade sob a perspectiva dos países que são inferiorizados, nos conectar à nossa ancestralidade africana", comenta Cassandra, que enaltece como grande inspiração de vida a força da mulher negra, "que carrega o DNA mais antigo da humanidade, que constrói na realidade desafiadora de cada dia oportunidades para viver, que como minha mãe criou três filhos sozinha, num mundo tão racista, sexista e cruel".



MAIA BOITRAGO
também fez seu nome trançando os fios de mulheres negras, muitas delas no difícil porém potente processo de transição capilar. Foi em 2015 que, então, agarrou-se a essa profissão. Uma de suas primeiras clientes conhecidas foi a musa Iza, que já cantava, mas ainda não estava no auge da fama. Hoje, tem entre suas clientes fiéis Taís Araújo, Jennifer Nascimento e Lellê, para citar algumas. Com o tempo, naturalmente expandiu seu trampo para o plural mercado da maquiagem, que, ao lado das tranças, é uma ferramenta poderosa de valorização da autoestima da mulher preta. A criatividade de Maia vem de diversas fontes, entre elas o mundo colorido e expressivo dos animes e quadrinhos.



Beauty artist e hair stylist, MIKA SAFRO assina editoriais de revistas e desfiles de grifes com criatividade,reforçando o espaço da maquiagem no universo da arte. No primeiro desfile de Angela Brito no SPFW deste ano, ela usou no rosto das modelos pétalas de flores reais, levando a outro nível as inúmeras possibilidades criativas da make tridimensional.



Quando tudo isso aqui ainda era mato, CAROL ROMERO já levantava a bandeira da maquiagem como ferramenta de empoderamento da mulher negra. Autora do primeiro livro de maquiagem para pele negra no brasil, ela é beauty artist há 12 anos e faz da sua profissão sua força de expressão. Para ela, a maquiagem e os cuidados com os cabelos são formas genuínas e ancestrais de valorizar a estética negra e trazer à tona pautas importantes para discutir a afrobrasilidade.


"A maquiagem vem como uma libertação para a mulher negra. Uma libertação estética, porque sempre tivemos o referencial do branco, do cabelo liso, da magreza. As negras não aceitavam os próprios corpos, porque era tudo muito eurocêntrico. Agora já conseguimos ver as mulheres negras assumindo seus penteados, que têm a ver com a nossa ancestralidade africana, desfilando esses penteados na rua, nas revistas, sem vergonha de ser o que é", afirma.


Para Carol, apesar dos avanços, a indústria da beleza ainda precisa ouvir e contratar mais profissionais negros para desenvolver seus produtos, e investir, em termos de formulação, em mais ativos e pigmentos que favoreçam a pele preta. "A missão do meu trabalho hoje é mostrar pras pessoas negras que elas podem estar onde elas quiserem, nas profissões que elas quiserem, fazendo o que elas quiserem. E que o negro é lindo, a gente não tem que ter vergonha da nossa cor, não tem que ter vergonha do nosso cabelo, e, sim, podemos estar em qualquer espaço", afirma a maquiadora, que hoje leva seu conhecimento para outras áreas, como o audiovisual, o cinema, a música, a literatura, espaços onde "a gente não se vê".


Ao falar de suas inspirações, cita as avós e a mãe, exemplos de luta para ela. No rol das famosas, Rihanna, por tudo o que ela construiu e pela forma como se posiciona enquanto mulher preta em tudo o que ela produz. "A brasileira Rosangela Negra Rosa tem uma trajetória muito importante e me inspira bastante por ter construído uma marca de maquiagem sozinha, indo contra tudo o que o mercado falava. Ela foi lá e criou uma linha com seis tons de base para peles negras", conta. "Dona Jacira, mãe do Emicida, uma mulher negra que também transformou o nada em muita coisa. A Drik Barbosa e a mãe dela, que vieram de uma situação periférica muito difícil e hoje estão aí mandando mensagens positivas, trazendo empoderamento para mulheres negras."



Empreendedora, DANIELE DA MATA tem uma trajetória de luta para reeducar o mercado da beleza. Ela é a criadora da primeira escola de maquiagem para pele negra no Brasil, a DaMata MakeUp. A empresa oferece desde  aulas de automaquiagem para iniciantes, com forte trabalho em torno da autoestima da mulher negra, a cursos e consultorias de aperfeiçoamento para profissionais do mercado.


Não deixe de conhecer mais sobre o trabalho dessas incríveis maquiatrizes em suas redes sociais mencionadas acima.

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