PERFIL STTP - Douglas Viegas #004
PERFIL STTP - Douglas Viegas #004
Dez 02, 2020

PERFIL STTP - Douglas Viegas #004

Victor Santo FOTO: Julio Nery

Cabuloso, venenoso e explosivo é Douglas Viegas, ou o famoso e poderosíssimo NINJA como normalmente é chamado, cara que se formou no basquete e dividiu conosco do STREETOPIA,  uma verdadeira história de troca, devoção e gratidão pelo esporte.

 

Tudo começou em 1995 na Escola Estadual Ministro Costa Manso, quando seu colega de classe, o Fred Bezerra, passou a questiona-lo devido a sua altura, o porquê de não jogar basquete. Apesar de praticar outras modalidades esportivas, esses questionamentos lhe serviram como um baita estímulo, e qualquer coisa a partir daí se tornou uma busca incessante pelo aro - qualquer parque, qualquer quadra e principalmente cabular aulas as sextas feiras a tarde para assistir NBA Action, programa transmitido pela Rede Bandeirantes de Televisão.

 

Outros dois amigos de infância e vizinhos, os irmãos Ricardo e Fernando, cultivavam a mesma paixão e também foram peças fundamentais que contribuíram com o amor de Ninja pelo basquete. Jogavam 21 no quintal de casa, colecionavam os hoje clássicos ‘Upper Deck Cards’ e ficavam imersos por horas no vídeo game jogando NBA Jam e NBA Live.

 

Apesar de sua escola ser tradicionalmente tomada pelo futebol, o amor pelo basquete já era tão grande, que conseguiram converter o ‘EE Ministro Costa Manso’ em um verdadeiro reduto da bola laranja, época marcada também pelo seu imenso desejo em se tornar um jogador federado onde fez seu primeiro teste em um clube, mas infelizmente não foi aprovado.

 

Em um outro momento, Ninja faria seu segundo teste, e desta vez no clube Banespa. Na ocasião, Padola, que hoje é um grande nome do basquete nacional, o convidou para treinar: “O Padola me perguntou se eu era sócio do clube e aí ele falou que era para eu começar a treinar...”

 

Desde o primeiro momento de Ninja com a bola de basquete, ele sempre soube exatamente o que iria fazer. A obsessão pela vontade de se tornar um jogador, era combustível que lhe servia para aproveitar cada minuto e cada detalhe de seus dias de treino. Apesar de fazer parte da equipe do clube, ainda não participava dos jogos mas era um enorme prazer estar ali: “Só de eu estar no time, já era tudo pra mim. Esse senso de estar no time, fazer parte de uma equipe de basquete, era a coisa mais f*oda do mundo...”

 

 

A paixão pelo jogo era tanta, que mesmo não jogando, convidava seus amigos para assistirem aos jogos. A única coisa que ele queria é dividir e gritar para o mundo aquela alegria que transbordava quando o assunto era o basquete, queria de alguma forma se tornar algo próximo ao que seus ídolos se tornaram (Magic Johnson, Michael Jordan e Shaquille O’neal), queria mesmo era viver aquilo e quem sabe um dia ser como eles, jogadores profissionais da NBA.

 

Foi aí que surgiu a oportunidade (após muito insistir aos seus pais) de fazer um intercâmbio nos Estados Unidos. Seu argumento, além da paixão pelo esporte era que se ele estivesse no país e ‘próximo’ aos melhores, ele de certa forma teria alguma chance de chegar ao tão sonhado lugar. Não havia um plano B, um atalho ou qualquer coisa que pudesse fazer com que ele desistisse do que já tinha já tinha escolhido se tornar.

 

Com 16 anos e após 6 meses representando o infanto-juvenil do Banespa como federado, que aliás é uma de suas mais lindas conquistas, seu novo destino seria Madison, subúrbio de Cleveland, Ohio, onde estudaria na Madison High School. Tudo foi combinado previamente com seus pais americanos que junto com os estudos, o objetivo era que ele pudesse continuar jogando basquete na escola, e assim o fez.

 

O jovem Douglas vivia um sonho! Era basquete no quintal da nova casa americana, na rua com os amigos, e finalmente na escola após as aulas, já que tinha sido foi aprovado no teste para o time de basquete. Embora participasse de algumas competições, passava a maior parte no banco, e mesmo assim, se mantinha focado treinando duro para que seu sonho se materializasse de alguma forma: “O trabalho duro ganha do talento sempre que o talento não trabalha duro...” relembra.

 

Ele começou a conquistar a confiança de seus técnicos quando era utilizado sempre nos minutos finais das partidas, o conhecido ‘garbage time’. Podia representar não muita coisa, mas para ele eram poucas e únicas as oportunidades como essas onde fazia o melhor e executava com perfeição repetidamente a cada jogo, todos os fundamentos aprendidos nos treinos. A escola percebeu a desenvoltura do jovem sênior e quiseram dar ‘um jeito’ para que ele pudesse também competir como ‘sophmore’, mas não foi possível e assim que se formou, voltou para o Brasil e de novo ao Banespa e como cadete.

 

O bom filho a casa tornou mais explosivo do que nunca. Ele queria mostrar para todos que questionavam o seu jogo, o quão preparado e infinitamente melhor que antes. Quem foi seu parceiro de quadra e participou ativamente desse momento, foi o Eduardo ‘Magrão’, que segundo Ninja, ainda que o time não estivesse em um momento muito satisfatório, formaram uma dupla ‘venenosa’ – Isso chamou a atenção de seu antigo técnico Padola, neste momento, técnico do Palmeiras, que novamente o convidou para jogar no Juvenil do clube, onde ficou por dois anos.

 

Ninja lembra com pesar de seus últimos dias no Palmeiras, já que o Juvenil tinha sido eliminado do campeonato, e pela falta de oportunidade de outros clubes, já que almejava o profissional, temia que sua carreira tivesse chegado ao fim. Chorando no vestiário, disse ao colega Patterson que foi ao seu encontro: “Acabou tudo. O que eu preciso fazer para eu virar jogador profissional? Eu faço qualquer coisa, QUALQUER COISA...” Seu colega respondeu: “Primeiro, não ter uma gota de álcool na sua boca, segundo você vai treinar mais do que todo mundo, terceiro é Deus acima de tudo e vai ficar tudo bem...”

 

Nada fazia mais sentido para Ninja aqui no Brasil, a não ser considerar a possibilidade de voltar ao Estados Unidos. Bastou uma ligação para seus pais americanos para pelo menos perguntar se ele podia passar a virada do ano lá. De volta à Cleveland em 1998, reencontrou seus amigos de high school em um dia qualquer de rachão, que souberam do seu interesse em se ‘encontrar’ novamente com o basquete. Até que um deles perguntou porque ele não tentava uma bolsa de estudos na faculdade.

 

Graças novamente aos seus pais americanos, que fizeram a ‘ponte’ com a Lakeland Community College, Ninja, na condição de avaliado, pode treinar durante uma semana para que pudessem entender se ele de fato atenderia tecnicamente as expectativas do time para então receber a bolsa. Pouco tempo depois, a família o chamou para uma conversa para dizer que a faculdade havia oferecido uma bolsa de estudos.

 

Sem qualquer condição de se manter na cidade devido a poucos recursos financeiros, seus pais novamente intercediam por ele com a condição de que ele poderia ficar ali, desde que treinasse mais do que todos e que estudasse muito.

 

Ninja tentava conciliar a rotina de treinos, com o curso de artes cênicas e com o trabalho de segurança escolar que conseguiu para ajudar com suas despesas. Em parelelo, seu pai americano, continuava dando todo o suporte e se fazendo presente em todos os treinos do apadrinhado brasileiro – ele queria ter certeza de que estava tudo fluindo bem e que o jovem estava bem encaminhado.

 

A história parece que se repetia, mas Ninja, apesar de treinar com o time, não jogava. Viajava por todos os estados, participava das rotinas diárias, mas ainda não tinha chegado o momento de mostrar para o que veio. No ano seguinte, pode jogar pela primeira vez, e logo na estréia marcou 19 pontos, no segundo jogo 28 pontos e cada vez mais ganhava confiança.

 

Ninja teve um resultado satisfatório ao término dessa temporada, e em 1999, através da indicação de Jonathan Burge, grande jogador e companheiro de time, pode participar da liga de verão, a Summer PRO-AM. Ele relembra um dos momentos mais marcantes, quando adentra o CSU Convocation Center (hoje Wolstein Center), se depara com uma das quadras mais lindas que já viu na vida e de quebra com Bob Sura (17ª escolha na 1ª rodada pelo Cleveland Cavaliers no Draft da NBA de 1995) e Steve Logan (30ª escolha na 2ª rodada pelo Golden State Warriors no Draft da NBA de 2002) e completa: “Brasileiro não podia ir pra NBA, né!? A gente tava lá...”

 

Sua atuação pelo time universitário estava muito boa fisicamente e tecnicamente, assim como a campanha do time. Saudoso, ele destaca a experiencia de ter Earl Boykins (faz estreia em 1999 na NBA pelo New Jersey Nets) como armador de seu time: “Baixinho de 1,65m, veneno puro, p*ta maluco f*da. Acho que é o melhor armador que eu já joguei na vida. De confiança, magricelo, dominava o jogo...”

 

 

Ainda nos jogos pela ‘summer league’, Ninja lembra quando chegou contra Bob Sura e anotou 16 pontos: “Acho que o Bob Sura foi o primeiro e o único cara que joguei contra que eu não tinha o que fazer para marcar ele. Ele é o cara mais impressionante em termos de sagacidade...” Ninja continua: “NÃO TINHA COMO MARCAR ELE, ele fazia o que queria, nunca vi ninguém jogar igual até hoje...”

 

Após a summer league, ‘Doug’, como era chamado pelos seus parceiros de time, pode também participar do Stop 250 JUCO Players, competição muitas vezes dedicada a atletas considerados inelegíveis academicamente em um nível superior. Em seguida, teve a oportunidade de participar de um acampamento de basquete na ‘Indiana State’, onde jogou por exemplo com Steve Francis (2ª escolha na 1ª rodada pelo Vancouver Grizzlies no Draft da NBA de 1999).


Propostas de universidades não paravam de chegar, além disso, a campanha do time estava tão boa, que até se cogitava a disputa das finais do ‘Junior College’, mas infelizmente uma fratura no quinto metatarso em um dia de treino adiou temporariamente essa conquista. Douglas, a partir daí vivia um momento muito difícil, saudades de casa, tempo de recuperação, solidão e um dilema: ou se recuperava no Brasil por 6 meses ou seguiria o “Medical Redshirt”, um afastamento que garante o retorno do atleta no ano seguinte - Ele escolheu o Brasil e muita coisa mudaria em função dessa decisão.

 

A mudança na rotina, a perda do foco em função das festas, retardaram de certa forma seu processo de recuperação e para piorar, se lesiona novamente em um rachão entre colegas no Parque Vila Lobos, em São. Sua volta aos Estados Unidos foi imediata e ali enfrentou uma cirurgia, que o deixou afastado por 1 ano das quadras, tempos de muita provação.

 

Deu tudo certo, e em 2002, ‘Doug’ finalmente recebia uma proposta da Wagner College por intermédio da lenda do basquete universitário e tecnico Derrick Wittenberg para representar o Seahawk Basketball, time da primeira divisão da NCAA. Ninja, aproveita e relembra Wittenberg: “O maior motivador que já joguei na vida, o cara faz você se sentir imbatível...”

 

Sua chegada à Wagner marcava a mudança de tudo em sua vida, principalmente por estar se abrindo um novo horizonte que permitia um olhar mais apurado sobre as prioridades da vida: “Ai você vê que não sabia nada de basquete. 1ª divisão e NBA é outra pegada. Disciplina, a dedicação, os treinos, a intensidade, o compromisso. Agora o barato tinha virado profissional mesmo...”

 

Todo esforço dedicado em sua jornada estava valendo a pena, e ter chegado à NCAA parecia um sonho, porque faltava muito, mas muito pouco para se tornar o jogador profissional que sempre sonhou.

 

A competitividade também aumentou e Ninja teve que aprender a lidar com a hostilidade, já que passou a representar uma ‘ameaça’ para os que ali competiam com ele. Seu posicionamento em quadra, se tornou uma questão de sobrevivência e uma busca incansável pelo respeito que foi até motivo para pensar em desistir. O desgaste emocional que esses eventos estavam lhe causando eram insuportáveis.

Douglas estava precisando de algo que o motivasse para continuar em sua luta diária de treinos, até que um amigo lhe dedicou lhe mandou a música 8º Anjo do grupo de RAP 509-E, onde se transformou em uma de suas maiores injeções de ânimo seguida de um desabafo aos seus companheiros de time: “Eu sou jogador profissional de basquete e quem estiver no meu caminho eu vou massacrar, custe o que custar. Eu só saio daqui no caixão...”


A partir desse dia, tudo mudou, tudo fluiu melhor, a relação com todos melhorou e Doug conseguiu ‘a força’ o respeito que merecia. Pouco tempo depois, o time conquistou em 2003 e após 100 anos, o título da Northern Conference da NCAA. Nesse momento qualquer tipo de especulação sobre Draft da NBA foi descartada, já que Douglas não tinha estatísticas suficientes.

 

Depois de formado e de volta ao Brasil novamente, sua nova casa seria o Data Basquete São Bernardo, comandada pelo grande Marcel de Souza, profissional que Douglas tem profunda admiração: “Pra mim o melhor técnico do Brasil. Ninguém sabe como lidar com o ser humano como esse cara. Jogava basquete e se formou médico, um gênio...”

 

O ala teve também passagens pelo São José dos Pinhais/Keltek, Joinville, Corinthians de Santa Cruz do Sul, Barueri e Palmeiras, onde encerrou sua carreira.

 

Para Ninja, o basquete é tudo e por isso seu compromisso com o esporte não parou aí, seu compromisso continua através das experiências que acumulou ao longo da vida, podendo dividi-las com as pessoas no sentido de eleva-las e de impactar positivamente de alguma forma quem realmente quer chegar lá, portanto, “NUNCA MEXA”.

 

 

 

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