UMA VIAGEM AOS PRIMÓRDIOS DO HIP-HOP
UMA VIAGEM AOS PRIMÓRDIOS DO HIP-HOP
Mar 26, 2021

UMA VIAGEM AOS PRIMÓRDIOS DO HIP-HOP

Luciana Mazza FOTO: Getty Images

Muitos falam da Cultura Hip-Hop, dos seus elementos, outros se acham donos dessa mesma cultura, sem ao menos conhecer suas origens e suas principais ideias, mas se informar sobre o passado é essencial para viver o presente e passar conhecimento de forma correta, construindo o futuro. Falar sobre o começo, é lembrar de Kool Herc, ele era “o cara”! Foi considerado o “Pai do Hip-Hop” na totalidade. Kool fazia Graffiti, era DJ, MC e sua crew dançava.


Quando fazia uma festa, todos estavam lá! Ele foi o primeiro grande DJ, todos dançavam em suas festas, as “Block Partys”, era impossível ficar parado, ele tocava no “Sedgwich Ave”, no Bronx, suas caixas de som eram grandes e a música era escutada de longe. A festa acontecia dentro e fora! Sempre tinham muitas pessoas do lado de dentro e do lado de fora. Era possível, em determinado momento da festa, escutar “Esse é o DJ Kool Herc e você sempre volta para ouvir mais”. Foi nessas festas que nasceu o Hip-Hop. Herc tocava uma parte do disco que tinha um “break down” nele, que hoje é o que chamamos de “Break Beats”. Toda a música do disco saía e ficavam apenas as batidas. Essas batidas eram frenéticas e enlouqueciam as pessoas que estavam escutando. Era um momento muito esperado por todos. Por exemplo, na música de James Brown, quando chegava em “…a clap your hands”, ele repetia, “stomp your feet, stomp your feet”, o nome dessa parte da música se chamava “carrossel” e era nessas horas que os “Breakers” dançavam.



A palavra B-Boy veio de Kool Herc, deveria ter representado o Bronx, na verdade era “Breaking Boys”. Quando a galera estava “Breaking” nas festas, significava que estavam procurando confusão, eram “Breaking Boys” e “Breaking Girls”. Breaking vem da terminologia de rua. A pergunta: “Por que você está Breaking?”, significava “Por que você está fazendo coisas fora do normal?”. Estar zangado era estar “Breaking”, ou seja, nos dias de hoje seria “estar bravo, está chutando o balde!”. Essa se tornou uma expressão oficial quando Kool Herc usou. Os B-Boys eram “os meninos que quebravam” e as B-Girls eram “as meninas que quebravam”, não tinha nenhuma ligação e não veio dos breaks no disco, como muitos pensam.


O Breaking começou com os seus fundadores da dança, na década de 70. Era algo que aparecia nas festas. A palavra “B-Boying” significa a manifestação corporal do Hip-Hop. Não eram só os pés, mãos em movimento, eram usadas todas as partes do corpo. Cabeça, pescoço, mas intelecto e também caráter. O Breaking nunca foi moda, mas uma arte legítima! Os B-Boys comiam, bebiam, respiravam e pensavam “B-Boying”. Toda vez que se escutava “Sex Machine”, “Just Begun”, “Apache” que era hino de todo B-Boy, era possível ver a música ser sentida no corpo, fazendo esses meninos dançarem, tratava-se de algo mágico, que apenas a música e sua energia faz com as pessoas. Na verdade, foi a música que fez desenvolver todos os estilos e movimentos. O Breaking é Hip-Hop puro! Ken Swift uma vez disse: “O Breaking começou com uns poucos irmãos e irmãs que não se importavam com o que as pessoas pensariam de seus movimentos”. Eram meninos sem dinheiro, que moravam nos guetos, no meio do ambiente urbano. Nas festas, a pessoa entrava fazendo pose, depois descia ao chão. E se os movimentos fossem bons, se formava uma roda em volta para que outro pudesse também entrar e desafiar o mano na dança. Nesse clima, surgem pessoas como os “Nigga Twins”, que dançavam para Herc. Eles desciam até o chão e giravam, foram os primeiros a fazer isso. Chegavam nas festas com charutos e casacos compridos: eles arrebentavam! Dançavam em cima de cimento.


ALGUNS FUNDAMENTOS:


O “Top Rock” que era feito no início permanece presente até hoje no Top Rock que os breakers fazem. Top Rock é o cartão de visitas, quando o B-Boy apresentava o seu estilo. Havia também outros movimentos, como o Indian Step (Passo de Índio). Mas os movimentos no chão surgiram mesmo entre 1974 e 1975. Spy, do “Crazy Commanders” foi o criador do “Footwork” que é a base do “B-Boying”. Mais tarde, seria adicionado aos fundamentos o “Freeze” (congelamento de movimentos) e, por último, os “Power Moves” (movimentos acrobáticos).



Então, o que se fazia no início foi levado para fora do Bronx, quando surgiram os “Zulu Kings”, que faziam uma combinação de “Sweeps” com passos russos, que a pessoa dobrava os braços e chutava para frente: eram uns passos bem básicos. Um B-Boy que lembrava muito o que se fazia no passado (chamado por alguns de “Old School”) é o Frosty Freeze, o Foootwork não parecia completo sendo associado ao início. É de Pop Master Fabel o comentário: “Ele fazia um estilo que quase nunca vejo ninguém fazer”. No “Zulu Kings”, Beaver (Castor) era o maior nome em “B-Boying”, sem discussão. Durante algum tempo, ninguém era melhor que Beaver, até que chegou Spy (Espião) que ganhou dele. Spy era conhecido como o “Homem Com 1000 Passos”, ele se tornou uma lenda! Usava chapéu vermelho e o cabelo “Black Power” por baixo, tinha uma energia única. Seus movimentos eram muito limpos e fluíam. Qualquer coisa que fazia se tornava singular!


Já Legs fez o “Swipe” no ar, sendo muito original. “Trac2” eram incríveis, se arrumavam para sair, eram como estrelas. Inventaram muitos passos que hoje ainda se vê. O Breaking era considerado underground, até que Herc trouxe tudo para fora, todas as coisas underground, tudo que acontecia nos corredores, dentro das casas, foram levados para a rua. E aí começou a se espalhar pelo mundo todo, já não era algo apenas americano. Batch foi um dos primeiros breakers hispânicos! O estilo dos latinos era chamado de “estilo moreno”. Mas foram os porto-riquenhos que colocaram o Breaking nas costas. A “SalSoul Crew” foi onde todos surgiram. Depois da “SalSoul”, Batch começou a “TBB Crew” que era uma das melhores crews de Breaking. Mas naquela época, alguns foram mortos e outros presos. Certa vez, Batch falou que talvez se não fosse isso eles teriam ganhado muito dinheiro naquela época.


Em 1977, começou a “Rock Steady Crew”, muitos dos membros eram B-Boys super estrelas do Bronx. A “Rock Steady” representava os B-Boys sérios! Mr. Freeze era um dos únicos B-Boys brancos naquela época. Ele andava em todos os cantos e estava em todos os lugares e dizia: “Sou o Mr. Freeze, da Rock Steady Crew!”, e as pessoas gostavam dele. A “Rock Steady Crew” chegou a ter 500 membros e nesse momento, a mídia se interessou por isso. Na época, saiu na revista “National Geografic”, no jornal “New York Times”, no canal de televisão “ABC News”, isso aconteceu em 1980.



Então, surgiu a “Negril”, a primeira discoteca que era um “Clube do Hip-Hop”, no centro de New York e todos estavam sempre lá. “Negril” escreveu a história do Hip-Hop para o resto do mundo. E nessa época, naquele local, batalhava “Floor Master”, que era uma crew atlética que girava muito e que eventualmente poderia até encontrar seu caminho nos Jogos Olímpicos contra a “Rock Steady Crew”. Mais tarde, a “Floor Master” mudaria o nome para “New York City Breakers” e, sem dúvida, foi a crew que mais comercializou a dança, eles e levaram o Breaking para a grande massa. Em 1984, nos Jogos Olímpicos, a crew se apresentou no evento e também estavam presentes nos grandes programas de televisão americana. Se apresentaram para o Presidente Ronald Reagan. Nessa época, a mídia batizou a dança de “Breakdance”, também foi nessa época que foi feito o primeiro filme de Hip-Hop chamado “Wild Style” (Estilo Selvagem). A ideia era mostrar que todos os elementos eram conectados e faziam parte um do outro no Hip-Hop, capturando a essência! Em 1983, foi a vez do filme “Flash Dance” (Em Ritmo de Embalo) quando a “Rock Steady Crew” foi convidada para participar. No filme, aparecem Ken Swift, Crazy Legs e Frosty Freeze, o mundo conheceu os B-Boys por meio do filme.



Em 1984, muitas crews começaram a se separar. “Rock Steady Crew”, “Dynamics”, foi nesse ano que foi feito o filme “Beat Street” (A Loucura do Ritmo). Esse filme deu continuidade ao “Wild Style” no sentido de mostrar a cultura Hip-Hop de New York. Nesse ano, também, morreu o B-Boy Matt, do “New York City Breakers”, num acidente de moto. Nessa época, muitos passaram dificuldades, traficavam, alguns foram assassinados, presos. Outros se dedicaram a outras coisas e trabalhos.


A mídia começa a destacar o Rap, pois na verdade eles podiam vender discos que as pessoas poderiam levar para casa, enquanto que com o Breaking isso não acontecia. Os B-Boys abriram as portas para o Rap. Muitos Rappers foram criticados por não manter a essência, por esquecerem os B-Boys em seus vídeo clipes, colocando mulheres nuas da cultura e por cada vez mais visar uma indústria milionária.


Mas o Breaking não foi uma febre passageira, ele continuou e todo dia apareciam em cada canto do mundo novos B-Boys e B-Girls. O Breaking continuava sendo vida, arte, dança e um estilo de vida. Mos Def dizia: “Não há diferença entre Ken Swift e Baryshnikov: a dança em suas diferentes expressões é sentimento. E isso é louco!”. 



Nos aniversários da “Rock Steady” todos compareciam, de todas as partes do mundo. Eles vinham para batalhar! A verdade é que o Hip-Hop não estaria onde está se não existissem as batalhas. Se alguém quisesse batalhar, você tinha que respeitar, afinal, as brigas foram trocadas pelas batalhas nas rodas. Mas em relação aos excessos, são de Crazy Legs as palavras: “Se uma pessoa não consegue se controlar numa batalha, então não merece ser chamado de B-Boy”.


O tempo parecia areia e ia embora pelos dedos, outros dias chegaram e uma nova geração do Breaking nascia. Certa vez, Spy disse: “Eu os vejo e acho que estão fazendo coisas belas e criativas”. Outros da “New York City Breakers” declararam: “Toda geração tem a sua criatividade e energia para mostrar” e, ainda, “Estou feliz que já paguei as minhas dívidas. Tenho 31 anos, agora deixem os meninos batalharem!”. E Crazy Legs: “Todos os B-Boys pelo mundo devem continuar, pois somos o passado, eles são o futuro e todos juntos somos o presente. Vamos dançar!”.



Afrika Bambaataa, que foi o fundador do “Zulu Nation”, que tinha como princípio as bases do Hip-Hop, exortou: “Paz, amor, união e diversão foram os responsáveis pela existência do verdadeiro espírito do Hip-Hop. Qualquer coisa diferente disso não é Hip-Hop! Discriminação de qualquer espécie não é Hip-Hop”, ele falava: “O Hip-Hop não é só coisa de negros e de latinos. Venham todos, participem! Não trata-se de raças, nem cor, estamos falando de habilidade, de sentimento e de ideologia”.



Esse texto foi escrito por meio de pesquisas e testemunhais de quem viveu essa época.

 


Luciana Mazza: Jornalista, Cineasta e Editora no Portal Breaking World

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